sábado, agosto 9
Bandeijão, revisitado
Após exatos cinco anos de afastamento essa semana tomei coragem e adentrei mais uma vez os portões do bandeijão. Num primeiro momento a estranheza (vocês podem imaginar o quanto qualquer coisa na USP pode mudar em cinco anos), entretanto, após notar as diferenças na decoração, a nova disposição geral dos mesmos elementos de outrem e algumas poucas (porém muito impactantes) mudanças, pude identificar o velho restaurante. E foi como revisitar velhos amigos. Pois de fato, através dele, revi junto de mim na fila e sentados ao redor na mesa bons amigos e colegas que já não estão mais aqui. Para essa aventura histórica eu convidei o Gabriel, que corajoso e decidido aceitou o convite. Tivemos sorte, era dia de frango empanado com creme de milho. Lembrava-me de ser um menu imperdível.
As primeiras mudanças se vêem logo na entrada, há mais controle para o acesso e munido de minha carteirinha eu passei pela catraca. As antigas estantes onde se colocavam pertences em geral foram trocadas por um sem número de escaninhos, reflexo da maior densidade populacional do campus. Não existem mais os famosos saquinhos para talheres no bandeijão (ainda bem que eu garanti os meus), os talheres são dispostos em grandes copos e você se serve de garfos e facas como aprouver. Coisa que eu achava estranha na ESALQ hoje existe no bandeijão em São Carlos, podemos nos servir em prato ou no tradicional bandeijão (minha escolha e do Gabriel em nome da memória). Além de uma reviravolta na disposição dos demais elementos para uma eventual otimização dos processos envolvidos (entrega de sobremesa, serviço da "mistura" e devolução de bandeijas) o restaurante em continua o mesmo. Cabe, no entanto apontar uma mudança muito importante. As antigas mesas dispostas em enormes távolas foram substituídas por compostos parecidos com os encontrados nas praças de alimentação dos shoppings (aqueles com a mesa e cadeiras juntos numa única peça).
A comida, na minha opinião, foi a grande mudança que esses anos proporcionaram ao lugar. Já na entrada (agora a comida fica logo depois da entrada) via-se que aqueles anos de sofrimento fazem parte do passado. Peguei a minha bandeja que imediatamente recebeu a aplicação de um belo e suculento filé de frango. Minha imediata reação ao ver tão generoso corte galináceo foi olhar para trás em tom de indagação ao Gabriel, que como também me olhou como se perguntasse se aquilo era algum tipo de piada ou equívoco segui sem fazer qualquer tipo de comentário. É interessante ressaltar entretanto que o tratamento simpático por parte das "tias" (por falta de outro nome) foi das poucas coisas que não sofreu qualquer alteração nos longos anos que se seguiram à minha decisão de cortar o bandeijão do meu cardápio. Foi justamente um relapso arremesso de creme de milho sobre meu filé de frango e mais uns dois compartimentos da bandeija que me remeteu de volta à realidade. Um grande avanço foi a inclusão de um cardápio diferenciado aos amigos vegetarianos e àqueles que prezam por uma alimentação mais “natural”. Arroz integral, saladas diversas, legumes sortidos e carne de soja. Vale dizer que o padrão de atenção aos pequenos detalhes que fazem os acompanhamentos apetecerem aos olhos e principalmente ao estômago continuam os mesmos. Nunca imaginei que fosse possível empedrar arroz integral e é também uma surpresa imaginar que a cozinha não se dê ao mero trabalho de hidratar a carne de soja, me senti comendo um similar de péssima qualidade de Bonzo ou Frolich (sem trocadilhos com o nome do Ricks, por favor). De toda forma parece que o feijão finalmente ganhou consistência e deixou de ser uma água suja sem conteúdo. O arroz, apesar de tudo, parece um algo mais do que uma massa única de amido e a salada está curiosamente inerte. Os tomates... bem, estes continuam verdes. E há ainda as mais improváveis, porém tradicionais, combinações de legumes e afins cozidos. Repolho com lentilha, cenoura com cebola entre outras.
A atmosfera do bandeijão, no entanto, é inconfundível. Aquele ar pesado, mistura do vapor proveniente da cozinha e do aroma do que quer que se sirva que, fielmente, mantém o odor pesado, marca registrada da culinária de massa.
Finalmente digo que foi feliz o retorno. O bandeijão é, antes de tudo, um evento, um lugar social. É o hábito comensal levado às últimas proporções. É onde se misturam faxineiros e engenheiros e físicos e guardas e “computeiros” e todos os demais elementos dessa pequena nação universitária. Só não pude, infelizmente, presenciar um bandeijasso, ocorrência que com certeza coroaria a minha visita.
Thiago amplificou pensamentos às 18:21.
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